quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

brincando de amanhecer





O meu amado tinha coisas de menino:

dormia abraçado a mim feito criança,
gostava de doce e de ganhar camisas novas de presente.
Usava a água-de-colônia que lhe dei e ria:
"Pareço uma Paulina Bonaparte."
Olhava-me tão agradecido ao menor cuidado
como limpar seus óculos ou trazer-lhe água,
que era como se nunca tivesse tido infância.
(Gostava de rir, embora chorasse algumas vezes a meu lado.)
Abria as portas grandes da varanda de nosso quarto
sobre as florestas da Gávea, e de tudo se admirava:
"Espantoso! Qual o sentido disso?"
Quando eu não estava em casa, ficava aflito:
telefonava para conferir se eu voltara ao nosso cotidiano:
"Sabendo que você está aí, meu mundo fica em ordem."

O meu amado tinha coisas de menino:

mas seus olhos eram sábios
de entenderem quase toda a miséria deste mundo.

- Lya Luft, IV, no livro O Lado Fatal -



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    (um desenho dele)

Um dia, entrei numa van escolar. Livro nas mãos, não te vi olhando pra mim. Sete anos depois, era carnaval, eu não quis acreditar quando vi. Passei, você viu, eu vi: pedi um cigarro. Você disse meu nome e contou da van escolar, eu desacreditei, querendo prolongar a descoberta convidei: vamos tomar um café? Oito anos depois, brincando de amanhecer, eu ainda descubro o amor.

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